Guilherme Boulos (PSOL) | Análise de Programa de Educação

Confira a análise das prospostas para Educação do programa de governo do candidato à presidência Guilherme Boulos (PSOL), realizada por Rosimar de Fátima Oliveira, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde atua no Programa de Pós-Graduação em Educação: Conhecimento e Inclusão Social, Linha de Pesquisa Políticas Públicas de Educação. 

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“Um Programa para a Educação Brasileira”: comentários ao Programa de Governo de Guilherme Boulos (PSOL) para a Educação

O Programa de Governo de Guilherme Boulos (PSOL) para a Educação está organizado em nove pontos, que estabelecem uma agenda para as políticas educacionais com mudanças incrementais, no caso da educação básica, e mudanças fundamentais, no caso da educação superior. O eixo ideológico está estruturado na tensão entre o público e o privado. No caso da educação superior, essa tensão se apresenta por meio de políticas públicas regulatórias do setor privado e extinção dos atuais programas de financiamento estudantil privado e, no caso da educação básica, da afirmação e aperfeiçoamento dos instrumentos e mecanismos de políticas educacionais presentes no Plano Nacional de Educação (PNE) vigente, sobretudo tendo em vista a ampliação dos recursos da União para esse nível de ensino.

Os pontos estabelecidos no Programa Boulos para a educação incluem temas tais como: o papel da União, recursos públicos exclusivamente para escolas públicas, educação para todos, valorização das universidades, escolas democráticas, recursos suficientes para educação, avaliação na educação, valorização dos profissionais da educação e, por fim, a ideia de que educação não é mercadoria. Nesse conjunto, há maior ênfase e detalhamento das ações relativas à educação básica, que se concentram na implementação do PNE e na continuidade das políticas educacionais que antecederam o Golpe de 2016.

Desse modo, quanto à educação básica, o Programa Boulos não propõe novas alternativas para o enfrentamento do principal problema educacional brasileiro, que perpassa todos os demais e tem caráter estrutural – a desigualdade educacional -, mas afirma e se compromete com aquelas alternativas já definidas ou indicadas nos governos que antecederam o Golpe de 2016, sobretudo quanto às metas do PNE. Propõe, assim, quanto à organização da educação, regulamentar o regime de colaboração e o sistema nacional de educação, seguindo a tendência afirmada na Conferência Nacional de Educação (CONAE) de um novo pacto federativo no âmbito da educação e novos mecanismos de coordenação federativa nesse contexto. O financiamento da educação é destaque no conjunto das estratégias definidas no Programa, pois propõe regulamentar e incluir o Custo Aluno Qualidade inicial (CAQi) no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) permanente; equivaler o Piso Salarial Profissional Nacional (PSPN) ao salário mínimo do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), que atualmente é de R$ 3.636,04; além do cumprimento da Meta 20 do PNE, de ampliar até 10% do Produto Interno Bruto (PIB) os gastos em educação, embora não mencione os recursos para esse fim. O CAQi, aliás, é a alternativa de destaque relacionada à redução das desigualdades territorial, social e racial mencionadas. Para a educação básica, o Programa ainda reafirma as metas de expansão educacional e de erradicação do analfabetismo, bem como propõe rediscutir os atuais mecanismos de avaliação sistêmica e revogar todas as políticas educacionais do Governo Temer.

As mudanças quanto à educação básica, assim, são de caráter incremental, na medida em que agregam recursos, mecanismos e instrumentos às alternativas já identificadas para os desafios educacionais anteriormente ao Golpe de 2016. Essa continuidade converge com a expectativa dos diversos fóruns e segmentos educacionais envolvidos na CONAE e demais organizações e movimentos sociais adjacentes, que estruturaram suas pautas reivindicativas nesses termos, pelo menos desde a Constituição Federal de 1988 (CF/1988), tendo em vista a garantia do direito de acesso, permanência e aprendizagem escolar. Contudo, considerando que os atuais mecanismos da política para a educação básica não têm sido suficientes para reduzir de modo significativo as desigualdades educacionais, falta ao Programa Boulos melhor elaboração, clareza e propostas que façam a educação básica brasileira avançar para um patamar de maior justiça social com igualdade.

As propostas para a educação superior têm um caráter diverso daquele apresentado para a educação básica, pois estabelecem como ponto de partida a oposição ao mecanismo de expansão desse nível de ensino por meio do financiamento público de instituições privadas; não está estruturado com base no PNE, embora o plano seja mencionado, mas na necessidade de redirecionar os recursos públicos exclusivamente para as IES públicas e, a partir disso, promover a expansão desse nível de ensino. Sob esse eixo ideológico, propõe a extinção de programas como o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Programa Universidade para Todos (PROUNI) - com a transferência para as IES públicas dos estudantes beneficiados atualmente por esses programas e matriculados em IES privadas -, bem como maior controle e regulamentação da qualidade da oferta do ensino nessas instituições. Em contrapartida, há um amplo leque de estratégias relacionadas à expansão da educação superior pública, que vai desde a parceria com as IES estaduais, até o fortalecimento das IES federais, sejam universidades ou institutos federais. Além disso, a proposta de um programa nacional de ciência, tecnologia e inovação, com ação estatal forte e democrática, articula o papel da universidade a um modelo de desenvolvimento sustentável, comprometido com a erradicação da pobreza, a preservação dos biomas nacionais, a promoção dos bem-estar social e a qualidade social das IES.

No caso da educação superior, o Programa Boulos propõe novas alternativas para a sua expansão e oferta, radicalizando o caráter público estatal dos recursos destinados à manutenção e desenvolvimento desse nível de ensino e redesenhando o escopo e a escala da participação do setor público e privado nessa oferta e, pari passu, avançando na democratização do acesso à educação superior pública para segmentos da população excluídos desse serviço até então. Nesse aspecto, apresenta novas perspectivas para a redução da desigualdade na educação superior.

No conjunto das propostas, o Programa Boulos, ao retomar a tensão histórica entre o público e o privado na educação brasileira, afirma o caráter público da educação, seja por meio da alocação de recursos, seja por meio dos mecanismos de regulação estatais. Compromete-se com os segmentos sociais que, na educação básica, envolveram-se com a formulação de uma agenda afirmativa de direitos, ratificando os mecanismos e instrumentos vigentes antes do Golpe de 2016. Avança quanto à educação superior, na alocação de recursos financeiros e normativos para o setor público, a um só tempo em que articula expansão da oferta pública dessa etapa de escolarização a um modelo de desenvolvimento econômico de caráter nacionalista.