UPMS na 39ª ANPEd - relato de Fábio Merladet (UPMS)

por Fábio Merladet (UPMS) - Coordenador da página web da UPMS e articulador de novas oficinas

A Universidade Popular dos Movimentos Sociais (UPMS) nasceu em janeiro de 2003, durante a 3ª edição do Fórum Social Mundial, a partir da identificação de uma ausência de conhecimento recíproco entre movimentos sociais, organizações não governamentais e academia e da necessidade de superar o isolamento das alternativas para promover uma política intermovimentos baseada no diálogo, no conflito e na articulação entre a diversidade contra-hegemônica do mundo. A UPMS é uma experiência contra-hegemônica de universidade que tem se construído fora da lógica institucional, burocrática e hierarquizada das universidades convencionais, destacando-se por seu caráter trans-escalar, intercultural e intertemático, por sua aposta na ecologia de saberes, bem como por sua forma singular de lidar com a produção do conhecimento e com a articulação da diversidade de práticas, saberes e experiências que nela tem lugar. Não tem professores nem alunos; não possui sede física nem quaisquer bens materiais em seu nome; não tem grades curriculares nem conteúdos programáticos; não oferece aulas, disciplinas ou quaisquer cursos de formação e a condição para participar de suas atividades é o ativismo social e não o mérito acadêmico. Funcionando através de oficinas temáticas, que duram de dois a três dias e que consistem em reuniões presenciais de trabalho intensivo com períodos de discussão, estudo, lazer e socialização, a UPMS se define como um bem comum dos movimentos sociais na luta por outro mundo possível e constitui um espaço para o aprofundamento da reflexão, do debate democrático de ideias, da formulação de propostas, da troca livre de experiências e do diálogo e articulação para ações eficazes de ativistas, intelectuais, artistas, entidades, organizações e movimentos sociais locais, nacionais e globais que se opõem ao capitalismo, ao colonialismo, ao patriarcado e a todas as formas de opressão. 

Ao longo de quase duas décadas de existência, a UPMS realizou dezenas de atividades e oficinas em países da América Latina, África, Europa e Ásia, contando com a participação de mais de 800 movimentos, organizações, entidades, ativistas, artistas e intelectuais militantes de todo o mundo.

Em um cenário de graves ameaças à educação, à universidade e aos professores no Brasil, a UPMS se uniu à ANPEd, ao Museu da Maré e ao SEPE/Niterói para realizar na UFF a oficina “Defender e descolonizar a universidade: da resistência à ecologia de saberes”, reunindo professores, pesquisadores da educação e uma grande diversidade de comunidades, movimentos, lutas e resistências por justiça, dignidade e direitos. A oficina, realizada de forma simultânea às atividades da ANPEd, foi um grande sucesso por estabelecer um espaço privilegiado de comunicação, interação, aprendizagens reciprocas, alianças e ações comuns entre intelectuais progressistas e ativistas dos movimentos sociais. Uma experiência ousada e pioneira de “extensão ao contrário”, que ocupou a universidade com a poderosa presença dos saberes que nascem das lutas sociais, e que pode vir a inspirar muitas outras associações de pesquisadores a também estabelecerem canais de comunicação direta, horizontal e democrática com os que lutam contra as múltiplas formas de opressão e injustiça de nossos tempos.

Inusitada Universidade essa que reivindica ser popular e pertencer aos movimentos sociais: não tem professores nem alunos; não possui sede física nem quaisquer bens materiais em seu nome; não tem grades curriculares nem conteúdos programáticos; não oferece aulas, disciplinas ou quaisquer cursos de formação e a condição para participar de suas atividades é o ativismo social e não o mérito acadêmico. Sentados sempre em grandes círculos todos são educadores e educandos, todos tem algo de único a dizer e todos são portadores de conhecimentos singulares que fazem falta aos demais. A diversidade é o rosto dessa estranha Universidade. Nela sentam-se lado a lado professores, pesquisadores, indígenas, feministas, lideranças do movimento estudantil, ambientalistas, militantes da luta pela diversidade sexual, trabalhadores da economia solidária, população de rua, sem-terra, sem-teto, ribeirinhos, quilombolas, camponeses, ativistas da reforma urbana, sindicalistas, desempregados, indignados, pacifistas, migrantes e militantes do movimento negro, todos sem qualquer hierarquia.

Toda essa imensa diversidade, a princípio, possui muito pouco em comum. A princípio, há muito mais motivos que os separam do que motivos que os unem, mas nas oficinas da UPMS todos são convidados a ouvir reciprocamente os argumentos uns dos outros, a confrontar suas divergências, a escutar a legitimidade das aspirações dos demais e a criar plataformas, agendas e ações comuns sem nunca perder de vista sua autonomia e identidade. Sendo iguais na diversidade as lutas sociais de nosso tempo são convidadas a dialogar e desse dialogo surge a possibilidade do encontro com o Outro, a possibilidade do reconhecimento verdadeiro, a possibilidade de superação das divergências e de construção das convergências.