WERA 2018 World Congress | por Ana Cristina Juvenal da Cruz e Tatiane Cosentino Rodrigues (UFSCar)

por Ana Cristina Juvenal da Cruz e Tatiane Cosentino Rodrigues (UFSCar)

*pesquisadoras contempladas em edital de apoio da ANPEd

Entre os dias 03 e 05 de agosto de 2018, participamos do WERA  2018 World Congress, em Cape Town na África do Sul, cujo título Reimagining Worldwide Education Research se insere no debate teórico e metodológico que empreendemos junto ao Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da NEAB/UFSCar. Foram apresentados dois trabalhos contemplados no Edital 2018 - nº 001 da ANPEd. O trabalho “Theoretical and methodological implications of ethnic-racial diversity on the continuing education of teachers / [Implicações teóricas e metodológicas da diversidade étnico-racial na formação continuada de professores] se integra ao debate colocado no congresso ao descrever parte do processo de avaliação da experiência de formação continuada com professores de redes públicas de dezessete municípios do interior do Estado de São Paulo, Brasil, realizada no âmbito do projeto de extensão “Curso de Aperfeiçoamento em Educação das Relações Étnico-Raciais”, resultado de um Termo de Ajuste de Conduta entre a Universidade Federal de São Carlos e o Ministério Público Federal do Brasil. A apresentação provocou questões relativas à composição histórica da diversidade étnico-racial no Brasil e das ações dos movimentos sociais, especialmente negros, na garantia da construção de uma educação equitativa.

Já o trabalho “Abdias Nascimento academic development program: curriculum innovations in higher education [Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias Nascimento: inovações curriculares no ensino superior]” foi apresentado na forma de pôster e resultou debates interessantes com colegas de outras nacionalidades. O pôster apresentou dados do projeto “Conhecimento, pesquisa e inovações curriculares na formação de professores para a diversidade étnico-racial no ensino superior: questionamentos e contribuições das matrizes étnico-raciais e culturais, de saberes africanos e afrodescendentes”, aprovado no âmbito do Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias no Nascimento da Capes e está estabelecendo uma rede transnacional de investigação conjunta entre pesquisadores e pesquisadoras do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar –Brasil) em parceria com três instituições internacionais: Universidad Distrital Francisco José de Caldas (Colômbia), sob supervisão da Profa. Dra. Adela Molina; Geogia State University (EUA), sob supervisão da Profa. Dra. Joyce King e Université Paris Nanterre la Defense, sob supervisão da Profa. Dra. Véronique Francis. Essas professoras têm há algum tempo desenvolvido pesquisas em parceria com o NEAB/UFSCar junto à equipe desta proposta.

O objetivo de fomentar essa rede se destaca por inserir-se nos debates contemporâneos em torno das políticas de internacionalização e ainda por congregar nas lideranças locais dos países mulheres com diferentes pertencimentos étnico-raciais.

Observamos que os debates suscitados por esta pesquisa estiveram presentes nas conferências realizadas no WERA  2018 World Congress, pois o desafio que se constitui na contemporaneidade não é apenas o da inclusão e/ou inserção da diversidade cultural, mas como essa diversidade convergida nas diferenças “incomensuráveis” como apontam os estudos pós-coloniais e da diáspora africana que desafiam concepções curriculares e do campo da formação para a docência ao se colocarem no centro do pensamento epistemológico do trato com as diferenças. Um dos objetivos dessa pesquisa é de identificar os modos pelos quais docentes e estudantes mobilizam saberes e estabelecem diálogos teóricos com matrizes teóricas variadas. Não intentamos constituir uma proposição binária entre esses saberes e os demais, mas de situá-los no interior de um diálogo que possibilite o debate político e a troca de saberes.

Esses trabalhos refletem o esforço histórico realizado pelo NEAB/UFSCar e, de maneira ampla, do GT 21 Educação e Relações Étnico-Raciais da ANPEd cujo histórico de atuações na ANPEd tem consolidado o debate sobre as relações étnicas e raciais no Brasil. A experiência de se aproximar da África do Sul é ainda mais impactante nesse sentido, pois as realidades desses países se aproximam a partir da experiência da diáspora negra, das histórias de luta desses países para erradicar o racismo e discutir a convivialidade em um contexto diverso. Há ainda muitas possibilidades de trabalho conjunto e as discussões realizadas no WERA apontam para uma agenda de pesquisa que aproxime realidades locais em contexto global.  Essa agenda deve integralizar diáspora africana negra, conceito central a partir do qual se desenha a constituição de uma outra reconfiguração histórica que permita a “circulação dos mundos” como na sugestão de Achile Mbembe. Isso se alia às medidas globais tais como a realização da Década Internacional de Afrodescendentes da ONU entre 2015 e 2024 cujo tema é “reconhecimento, justiça e desenvolvimento”.

O reconhecimento de uma orientação de cunho etnocêntrico presente por um longo período presente nos currículos entendidos como lócus de produção de um conhecimento acadêmico específico, sublimou de seu espaço as experiências e saberes africanos e afrodescendentes. A busca por uma reorientação a esse movimento pode ser visualizado nos últimos anos por meio de políticas de reconhecimento multicultural em diferentes contextos nacionais, especialmente na área da educação, que possibilitaram a ampliação dos conhecimentos acerca das influências das matrizes africanas e da diáspora negra nas ciências naturais, humanas e exatas. A percepção que orienta nossas pesquisas é de dar continuidade ao projeto de formação e de construção epistemológica gestado no interior da história de intelectuais ligados ao movimento negro cujas ações sempre estiveram em consonância com elementos do debate internacional no que tange as relações raciais na construção de  outros laços de pertencimento com o estabelecimento de uma cultura própria ao Atlântico negro que somente na experiência dos negros significou formas de lidar com o sofrimento, morte e a resistência, mas também produziu uma pluralidade estética, cultural e epistêmica.

Por fim, cabe ressaltar a importância do apoio institucional da ANPEd para a participação no congresso.