Manifesto sobre portaria acerca de Expansão da Educação Superior por meio digital em Universidades Federais

A Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), por meio dos Grupos de Trabalho “Política da Educação Superior” (GT11) e "Educação e Comunicação" (GT 16) , manifesta preocupação com a publicação das PORTARIA Nº 433, DE 22 DE OUTUBRO DE 2020, que “Institui o Comitê de Orientação Estratégica - COE para a Elaboração de Iniciativas de Promoção à Expansão da Educação Superior por meio digital em Universidades Federais, no âmbito da Secretaria de Educação Superior, e dá outras providências” e com a PORTARIA Nº 434, DE 22 DE OUTUBRO DE 2020, que “Institui Grupo de Trabalho com a finalidade de subsidiar a discussão, a elaboração e a apresentação de estratégias para a ampliação da oferta dos cursos de nível superior, na modalidade de educação a distância - EaD, nas universidades federais”. Nesse sentido, cabe considerar que:

1- A Portaria nº 433 determina a composição dos grupos de trabalho com a maioria de membros da SESU/MEC. O Comitê de Orientação Estratégica – COE tem 6 membros da SESU/MEC; 2 da ANDIFES e 2 do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos – CGEE (MEC). Isso significa o poder de aprovação da SESU/MEC e a participação limitada da ANDIFES no COE. Além disso, não há a representação de entidades que atuam no âmbito da EaD pública desde os anos 2000, como o Fórum Nacional de Coordenadores da Universidade Aberta do Brasil – UaB.

2- A Portaria nº 434 já trata da operacionalização do GT que vai elaborar e apresentar estratégias para a ampliação da oferta dos cursos de nível superior, na modalidade de educação a distância - EaD, nas universidades federais. Ou seja, antes mesmo de iniciar os trabalhos do COE já se institui um Grupo de Trabalho para apresentar as estratégias de ação. Isso significa que a diretriz já está traçada, não abrindo espaços de discussões com a sociedade, que será impactada com essa política de expansão do ensino superior.

3- Pesquisas publicadas por professores, dentre as quais destacamos “Ensino Remoto: presente e futuro em disputa”, de Lalo Minto (2020)1, apontam que essa modalidade de ensino, do modo como tem se efetivado no Brasil, costuma não ter a qualidade que temos defendido ao longo do tempo, uma vez que, geralmente, se efetiva moldada por princípios empresariais nada compatíveis com o princípio constitucional da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Não se pode reduzir a função da Universidade apenas ao ensino. A adoção desse modelo de EaD alinhada ao princípio neoliberal de economia de custo, em prol do Estado Enxuto, traz consequências nefastas para o trabalho docente, com demissões, redução da carga horária de trabalho e a contratação de tutores e professores temporários.

4- Este modelo de EaD alinhada ao princípio neoliberal de economia de custo tem se mostrado, na realidade brasileira, um modelo excludente pois exclui negros, indígenas, afrodescententes, jovens que vivem na periferia e não possuem condições financeiras para contar com recursos tecnológicos e acesso à internet sendo o acesso feito em sua maioria por smartfones. Os dados da pesquisa "TIC Domicílios 2019", formulado pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic) indicam que cerca de 30% dos lares no país não têm acesso à internet. O estudo mostra, inclusive, que há uma diferença significativa entre as classes sociais: em famílias cuja renda é de até um salário mínimo, metade não consegue navegar na rede em casa. Na classe A, apenas 1% não tem conexão2.

5- Pesquisa feita pela Associação Brasileira de EaD (Divulgada na Globo News dia 13/10), com 5.500 pessoas entre estudantes, professores, pais e gerentes de escola, demonstra que, dentre os fatores que mais afetam a aprendizagem, a falta de contato pessoal é o que mais se destaca, com 82,65% dos entrevistados; 67,07% afirmam ser a dificuldade de estabelecer uma rotina. O acesso a dispositivos eletrônicos: 92% acessam pelo smartphone; 29% por computador e 24% compartilham o dispositivo eletrônico. 72,6% afirmam que a aprendizagem piorou com o ensino remoto.

Diante do exposto, manifestamo-nos contrários às iniciativas de expansão da Educação Superior por meio digital em Universidades Federais que desconsiderem estas desigualdades e dificuldades explicitadas pelo ensino remoto e que podem significar, em última instância, precarizar o trabalho docente (reduzindo professores e acabando com concursos), bem como diminuir ainda mais os recursos das universidades federais, que poderão assumir características muito diferentes das que conhecemos na atualidade.

Na defesa da expansão da Educação Superior no bojo da garantia do direito à educação pública, gratuita, laica e de qualidade social, a Anped, especialmente por meio das ações do GT 11 (Política da Educação Superior) e do GT 16 (Educação e Comunicação), posiciona-se no acompanhamento atento aos desdobramentos dessas iniciativas, conclamando a defesa da educação pública, gratuita  e de qualidade como direito de toda população brasileira, o que não é possível com o ensino a distância".
 

1 MINTO, Lalo. Ensino Remoto: presente e futuro em disputa. Universidade à esquerda. Jornal Socialista e independente. 21 de outubro de 2020. Disponível em https://universidadeaesquerda.com.br/coluna/ensino-remoto-presente-e-fut...